quarta-feira, 28 de julho de 2010

Dimensão Experimental lança projeto "Música, Cinema e Memória" na CCMQ (sala de cinema Paulo Amorim) em 25/09/2010.



Fotos do Dimensão Experimental: Arthur Castilhos

PROJETO MÚSICA, CINEMA E MEMÓRIA.
(Musicando obras do cinema de vanguarda da década de 20 do século XX)

O grupo Dimensão Experimental acertou sua participação no aniversário de 20 anos da Casa de Cultura Mário Quintana (24 horas de Cultura) onde apresentará no dia 25/09/2010 (sábado)ás 18 horas na Sala de Cinema Paulo Amorim o projeto "Música, Cinema e Memória". O projeto inclui a projeção de cinco curtas do cinema avant-garde dos anos 20 junto com a performance músical do Dimensão Experimental. Após a performance será realizado uma palestra sobre a importância histórica deste quase centenário cinema vaguardista. O projeto destina-se para o público em geral, afixionados em cinema e também para estudantes de ensino médio e superior.


H2O de Ralf Steiner - 1929


Le Retour à la Raison de Man Ray - 1923

Para grande parte do público, cinema experimental soa como coisa distante, inacessível. Uma experiência para iniciados. O projeto “Musica Cinema e Memória” de autoria do grupo de música instrumental Dimensão Experimental em parceria com a Casa de Cultura Mário Quintana (CCMQ) vai provar que esta é uma idéia equivocada, afinal, descobrir novas possibilidades da linguagem cinematográfica é tarefa que tem acompanhado os criadores do cinema desde os primeiros tempos.
Em 1911, o poeta e jornalista italiano Ricciotto Canuto, amigo de Apollinaire,
Braque e Fernand Léger, publicou uma espécie de panfleto intitulado Manifesto das Sete Artes, no qual defendia, para a chamada ‘sétima arte’, total autonomia da narrativa da literatura e do teatro. O cinema, para Canuto, não usava a ‘camisa-de-força’ do roteiro. Deveria ser uma experiência livre, tanto em sua abordagem artística quanto no conteúdo.


Ballet Mécanique de Fernand Léger - 1924

O AVANT-GARDE

Após a Primeira Guerra Mundial, a intranqüilidade econômica, política e social fragmentou os pontos de vista tradicionais, possibilitando a formação de um terreno fértil no plano cinematográfico.
O crítico e escritor Louis Delluc evidenciava na França o descontentamento com filmes comerciais, enquanto os artistas de vanguarda começavam a se interessar pela linguagem cinematográfica.
”Nos dez anos compreendidos entre 1921 e 1931, desenvolveu-se um movimento artístico independente na cinematografia. Este movimento denominou-se Avant-Garde... Este movimento de arte em filme foi paralelo a movimentos nas artes plásticas tais como o Expressionismo, o Futurismo, o Cubismo e o Dadaísmo. Foi não comercial, não representacional, mas internacional”. (Hans Richter in Art and Cinema, 1947).


Anemic Cinema de Marcel Duchamp - 1926

Foram vários os cineastas que produziram cinema de vanguarda neste período e alguns traços marcantes destacamos: o evidente interesse em não agradar nem lisonjear o gosto do público; desejo de criar algo novo a qualquer preço virando as costas a toda a tradição literária e artística; menosprezo do argumento e do enredo, em benefício da livre fantasia e da divagação poética eximida de todo imperativo estético ou moral e a busca de um surrealismo irredutível ao mundo da inteligência, da lógica e da clara consciência, que nascerá de uma utilização da linguagem cinematográfica destinada a criar o insólito. Os filmes de Avant-Garde foram algumas vezes denominados de “cinema absoluto” ou de “cinema puro” devido sua ênfase nos valores rítmicos e estéticos.
A partir de 1930, surge uma conjuntura política de regimes totalitários que defende ideais conservadores extremamente hostis a todo movimento de vanguarda. Tais governos vão encarar o Avant-Garde como uma forma degenerada de arte e muitos vão chegar a censurar as obras e perseguir os realizadores. Além disso, as amargas realidades da depressão econômica forçavam os artistas a engajarem-se sociológica e politicamente. Portanto, as perspectivas da arte de vanguarda tornam-se remotas e sombrias, fazendo com que alguns criadores abandonassem a cinematografia ou realizassem filmes de caráter comercial, migrassem para a América, ou tornarem-se clandestinos.

FILMES

Para este projeto piloto escolhemos cinco filmes de curta metragem que juntos totalizam 34 minutos de projeção. A escolha destes filmes foi uma tarefa difícil porem inevitável. Dada à qualidade destas películas, acreditamos que o presente projeto abre a perspectiva de futuras performances com outros clássicos do cinema vanguardista não só desta época, mas também das décadas seguintes bem como filmes de média e até de longa metragem. Os filmes escolhidos são os seguintes:

“Le Retour à La Raison” (1923) 2min. – Man Ray

O pintor e fotógrafo, Man Ray fez seu primeiro filme “Le Retour à La Raison” (1923) em um só dia. O título se refere a um retorno à razão, mas, paradoxalmente, o filme revela-se inteiramente sem razão. Utilizando-se de radiogramas, quadros feitos por objetos colocados diretamente sobre a película, como alfinetes e botões, o filme projetava efeitos metálicos na tela.
O corpo nu de uma mulher foi um dos únicos elementos concretos do filme, que continha cenas comuns em um contexto incomum.
Esta foi uma obra dadaísta, tanto pelos elementos utilizados quanto pelos seus resultados, uma vez que causou uma reação violenta na platéia sendo interrompida a projeção após um minuto.

“Ballet Mécanique” (1924) 11 min. – Fernand Léger

Fernand Léger, (1881-1995) foi um dos mais destacados pintores cubistas. Os seus quadros apresentam formas com volumetrias acentuadas e simplificadas, reduzidas a volumes primários, como cones e cilindros, acentuados por uma vigorosa modelação, denunciando a sua formação inicial em arquitetura e o fascínio pela civilização industrial do séc. XX. Ao contrário de Picasso ou de Braque, que viam na representação da mecânica do movimento apenas um meio para revelarem a mecânica da percepção, Léger devotou toda a sua vida ao estudo das formas das máquinas e dos objetos técnicos, acreditando sempre no poder de transformação da arte e na sua importância para o estabelecimento de uma sociedade mais justa e igualitária, baseada no progresso técnico e científico.
Inspirado pelo estilo tragicômico das primeiras diatribes cinematográficas de Charles Chaplin, Léger decidiu transpor para o cinema os seus princípios estéticos e o seu otimismo ideológico. O resultado foi a curta-metragem experimental Ballet Mécanique (1924), um dos mais antigos e importantes filmes abstratos, que se tornou um exemplo clássico da utilização de objetos quotidianos ao serviço da abstração formal.

“Cockeyed” (1925) – 3 min. – Alvin Knechte

Em Cockeyd: Gems fron the memory of a nutty cameraman (1925), Alvin Kenechte, realizou neste filme de apenas três minutos experimentos de sobreposição de imagens através da subdivisão da tela de forma inteligente e divertida criando efeitos surreais como um homem comendo uma lâmpada incandescente, pessoas, edifícios, carros, aviões, trens desaparecendo e reaparecendo, entre as cenas intrigantes que apresentadas pelo autor, evidenciam através do insólito confundir, e questionar a sanidade do expectador.

“Anemic Cinema” (1926) 6 min. – Marcel Duchamp

O primeiro filme de Marcel Duchamp “Anemic Cinema” (1926), cujo título brinca com as letras da palavra cinema, põe em movimento esferas rotatórias ou rotoreliefs (discos em que Duchamp desenhou linhas e círculos concêntricos e excêntricos) que, ao girarem, provocam no espectador uma sensação estranha, como uma nova dimensão. Inscritas nos espirais, as letras vão formando frases indecifráveis, compondo um dos fenômenos visuais mais puros, sensíveis e fascinantes, em uma tentativa de se produzir filmes estereoscópicos.

“H 2 O” (1929) – 12 min. – Ralf Steiner

Ralph Steiner (1899-1986), fotógrafo americano e cineasta. Após sua graduação 1921 do Dartmouth College, onde aprendeu técnicas de fotografia, Steiner se mudou para New York e estudou na Clarence H. White School of Photography. Cada vez mais socialmente engajado, Steiner voltou-se para um estilo de documentário mais realista. A mudança é particularmente evidente em seus filmes: o resumo do estudo inicial de água e luz, H 2 O (1929). Um filme rápido e experimental composto em torno do tema da água em todas as suas formas. Um estudo clássico das amostras de luz e texturas sobre a superfície da água Como um tipo de poema cinematográfico enfatizando o ritmo e alterações através das qualidades visuais das imagens e da estrutura da edição. Quando o cineasta move a câmera mais próxima da superfície reflexiva, as imagens tornam-se mais abstratas e visualmente dramáticas. Esta concentração de padrões de movimento, sombreamento e textura fazem de H 2 O uma obra maravilhosa.

OBJETIVO

A intenção do Grupo Dimensão Experimental é oferecer ao espectador através de composições contemporâneas próprias a possibilidade do contato com um dos movimentos mais criativos que se produziu na história do cinema em seus primórdios, através de filmes até pouco tempo inéditos ou desconhecidos para o publico, em sua maioria, resgatando um pouco da magia do cinema mudo, musicando alguns dos clássicos do cinema avant-garde dos anos 20.
O projeto também contempla, após a projeção dos filmes e performance musical, a realização de um debate sobre a importância histórica do cinema avant-garde, com pessoas especializadas em cinema, história do cinema (historiadores, jornalistas, antropólogos, cineastas...) contextualizando-o, tendo como uma das pautas a influência da vanguarda no cinema, contrastando o passado com o presente, em especial as diferenças de paradigma da época em que eclodiu, quando as utopias e a revolução estavam na ordem do dia em contraposição com o momento atual em que estas mesmas utopias parecem esvaziadas com o objetivo de avaliar as perspectivas de um cinema experimental na atualidade por ocasião das novas tecnologias (cinema tridimensional, digital etc.).

JUSTIFICATIVA

Entendemos que numa época em que a informação e a tecnologia viajam com extrema rapidez o resgate de formas e impressões do passado muitas vezes se perdem dada a essa velocidade que muitas vezes impedem uma profunda absorção e compreensão dos fatos, assim a memória apresenta-se com relevância histórica, visto o crescente interesse por esta área nos últimos anos. Ao nos referirmos a memória, temos como premissa oferecer contribuições no sentido de ampliar os referenciais de conhecimento por vezes explorado. A memória deste quase centenário cinema de vanguarda é aqui admitida sob dois aspectos pertinentes à construção teórica e metodológica: a memória coletiva, que resulta das experiências sociais e etnográficas do povo, e a memória cinematográfica, como algo que se possa traduzir pelos registros arquivados nos mais diversos suportes (película, vídeo ou mídia digital). Assim vemos, memória e informação como uma convergência sociointeracionista.
A memória a longo prazo é a memória de profundidade, onde ficam armazenados conhecimentos e vivências que se adquire ao longo do desenvolvimento por serem significativos. De outro modo, devemos considerar a própria história de vida social e cultural da coletividade, como produto de identidade dessa memória a longo prazo. O que importa na comunicação de massa não está na quantidade de indivíduos que recebe os produtos, mas no fato de que estes produtos estão disponíveis em princípio para uma grande pluralidade de destinatários.
Defendemos essa idéia por considerarmos que resgatar a importância do cinema mudo em especial o avant-garde é um processo que envolve a bipolaridade entre o emissor e receptor, de tal modo que ambos possam estar situados em um contexto comunicativo no qual se possa promover a interação pela linguagem.
Assim como a cultura não é homogênea, as linguagens que a expressam tampouco o são, propiciando grande diversidade de formas de expressão: erudita, popular, grupal. Verifica-se igualmente, dada a porosidade das fronteiras entre erudito e popular, institucional e marginal, uma grande imbricação que nos leva a falar de linguagens hibridas, ou seja, mescladas (sem que nenhuma seja necessariamente predominante), exprimindo pluralidade de vozes que se assumem como sujeitos da enunciação. A música instrumental, neste caso especifico, apresenta uma linguagem universal muito mais abrangente que a palavra escrita. Isto acontece por conta das diferentes línguas faladas pela humanidade e que por vezes, uma tradução incorreta, pode criar equívocos de interpretação justamente por ser direta e expressar pensamentos de acordo com a língua com a qual é falada. Neste sentido a música instrumental aliada às imagens visuais de filmes antigos e outros pode apresentar-se como uma alternativa livre nas interpretações fato que justifica o apoio a este projeto.

DIMENSÃO EXPERIMENTAL

Com uma atmosfera sonora que busca combinar a tecnologia e acústica, o grupo Dimensão Experimental tem como proposta musical a fusão do erudito e o popular com o jazz e o rock progressivo-experimental criando com isto uma estética própria, através de seqüências harmônicas por vezes pouco convencionais servindo-se como complemento, de películas e imagens digitalizadas, podendo ser uma evocação ou assimilação das vanguardas históricas, enquanto ruptura com produções conformistas contrastando passado e presente por meio das diversas formas de expressão cultural do homem, de lado a lado com o tempo e o cotidiano.
O grupo Dimensão Experimental foi criado em setembro de 1991 e o nome do foi inspirado no titulo do filme avant-garde / experimental do cineasta americano Dwinnel Grant “Three Dimensional Experiments” de 1945. Ao longo de sua história o grupo Dimensão Experimental realizou vários trabalhos destacando-se seu álbum estréia “A Dimensão Experimental” (1993), as trilhas sonoras dos documentários “Porto Alegre” (1993), “Taím, um Paraíso Ecológico” (1994), “Torres” (1995) e “55 Anos do Sesi” (2002) produzidos pela extinta Vídeo – Puc. Em 2009, lançou o vídeo All Wright (uma homenagem ao tecladista do Pink Floyd, Rick Wright) e o seu mais novo CD “O Mito do Eterno Retorno”.
Participou de vários projetos culturais promovidos pela prefeitura de Porto Alegre e Governo do estado tendo se apresentado em vários palcos da capital como: Teatro de Câmara Túlio Piva, Sala Radamés Gnatalli, Teatro Renascença, Terraço de Usina do Gasômetro, Sala Álvaro Moreyra, Sala-acervo Elis Regina e Teatro Carlos Carvalho.

Pesquisa e texto: Klaus Farina - Historiador, Músico, Compositor, Produtor Cultural e membro fundador do grupo Dimensão Experimental.

Discografia Independente:

A Dimensão Experimental - 1993
Trilhas - 1995 (inclui as trilhas sonoras dos documentários de Porto Alegre, Taím e Torres)
Sons, Colagens e Performances Variadas (ao vivo) - 1997
55 Anos do SESI - 2002
O Mito do Eterno Retorno - 2009

Dimensão Experimental é constituído por:

Álvaro Saboia - Teclados / Gaitas de Boca / Percussão /Apitos
Cláudio Schmitt - Teclados / Guitarra / Percussão / Programação Eletrônica
Klaus Farina - Teclados / Guitarra / Flauta / Percussão /Apitos / Ocarina / Programação Eletrônica

BLIBLIOGRAFIA

ARANDA, J. Luis Buñuel; A Critical Biography.
BRETON, André. Manifestos do Surrealismo.
MACHADO, Arlindo. Pré-Cinemas e Pós-Cinemas.
PEIXOTO RODRIGUES; Léo (organizador)e vários autores. Sociedade, conhecimento e interdisciplinaridade.
REDECINE, Revista do Festival Internacional de Cinema de Arquivo Ano 3 nº3 – Arquivo Nacional.
SHELDON, Renan. Uma Introdução ao Filme Underground.
SUBIRATS, Eduardo. Da Vanguarda ao Pós-Moderno.