quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Limite de Mário Peixoto amanhã no Clube de Cultura

Amanhã, dia 13/08/2015, ás 19 horas o Clube de Cultura (rua Ramiro Barcelos, 1853) vai apresentar mais uma edição do projeto Cinema Livre com o filme Limite (Brasil, 1931) de Mário Peixoto.

O grupo Dimensão Experimental apoia esta iniciativa do Clube de Cultura que tem por objetivo oportunizar aos amantes da sétima arte filmes de alta qualidade artística, passando longe das "películas digitais" dos sem graça, comerciais e neo-liberais shopping centers de Porto Alegre.


Em 2012, o Dimensão Experimental criou uma música original para ser utilizada em um fragmento 10 minutos do filme Limite de Mário Peixoto. Este fragmento de 10 minutos foi performado ao vivo em várias ocasiões inclusive como parte do repertório de filmes musicados ao vivo pelo Dimensão Experimental no Fórum Social Temático de 2012. O projeto Música, Cinema e Memória do Dimensão Experimental, tem por objetivo, o resgate e uma releitura da linguagem do cinema silencioso.
Abaixo transcrevemos a excelente matéria sobre o filme Limite, de Mário Peixoto que foi publicada no blog Clássicos do Cinema Mudo.


Limite, de Mario Peixoto

O cinema mudo brasileiro atinge sua expressão máxima quando, em 1931, Mario Peixoto (então um jovem com pouco mais que vinte anos) lança sua obra-prima, o longa-metragem Limite, que acabaria sendo seu único filme concluído. Trata-se de uma vigorosa obra de vanguarda que apresenta ricas alternativas de narração, ritmo, fotografia e montagem. Uma verdadeira aula de cinema feito com conceitos radicalmente novos e apaixonados.

Desde a apresentação de suas imagens iniciais, Limite revela-se um filme incomum, em desacordo com os padrões adotados pelo cinema em seu molde burguês-comercial. Suas imagens vêm carregadas de estranheza e desajuste, resultado de uma depuração que busca do real aquilo que nem sempre é o que se convencionou como fotogênico e que, portanto, nem sempre corresponde às expectativas estéticas do grande público, acostumado, em parte, aos espetáculos que fazem apelo ao teatro filmado e ao folhetim previsível.


Limite é um rompimento com o fazer artístico nos moldes aristotélicos. Sua graça e sua força expressiva nascem do vigor de seu experimentalismo, da poesia catártica de suas imagens-conceito, de sua narrativa intimista que valoriza o tempo psicológico e subjetivado de seus personagens. É um filme rico em abordagens não-usuais do desamparo humano, uma exposição crua e realista de seres desesperançados que vêem-se no mesmo barco perdido, resignados à um estado de coisas que mostra-se inalterável e do qual não parece haver fuga.
Interessante notar o seguinte : Em 1930, data de lançamento do filme, o cinema já se enamorara com a ideia de sonorizar-se. Num sentido contrario, esse filme de Mario Peixoto ergue-se como um monumento ao cinema silencioso. Um filme ‘mais mudo’ que os demais filmes mudos. Pensemos da seguinte forma : um filme mudo, ao apresentar letreiros entre as imagens, de certa forma perde sua mudez (pelo menos a mudez verbal) dentro do espectador (pois, como aprendemos a ler verbalizando, então, mesmo que leiamos em silêncio, ainda precisamos repetir mentalmente a palavra). Ou seja, a palavra como símbolo que representa e substitui um conceito continua presente no filme. Já em Limite, aparecem apenas dois letreiros (na cena do cemitério, quando o marido traído diz ao homem 1 que sua falecida esposa era ‘morphética’). Ou seja, o filme quase rompe definitivamente como o discurso verbal, prevalecendo a narrativa visual (e, portanto, o símbolo visual), com suas múltiplas associações sígnicas e possibilidades mais ricas de interpretação.


Os movimentos de câmera de Limite são impressionantes pela liberdade que assumem com relação à narrativa, ao cenário e mesmo aos personagens. Há um plano-sequência em que a mulher 1 está caminhando numa estrada (de costas para a lente). A câmera a segue até que ela para. Aí a câmera aproxima-se e faz um giro de trezentos e sessenta graus em torno da personagem (sem mostrar-lhe o rosto) voltando a parar atrás dela. A mulher torna a andar e a câmera a segui-la. Aí vem o inusitado : à certa altura a mulher sai da estrada (e do enquadramento), porém a câmera segue em frente enquadrando somente a estrada. Depois de alguns metros ela faz um giro de noventa graus e passa a focalizar a cerca que beira a estrada (e a mata de fundo), prosseguindo em deslocamento pra frente. Não bastasse, pouco depois a câmera inverte o sentido de movimento e passa a andar pra trás até enquadrar novamente a mulher, que agora está prostrada contra a cerca. Estranhíssimo. Belíssimo.


Prevalecem enquadramentos minimalistas e antinaturais. O diretor de fotografia, Edgar Brazil, usa com absoluta elegância ângulos altos, baixos, tortos, deformados. Foca detalhes e valoriza-os : um carretel de fio de costura, uma fita métrica, um peixe morrendo na areia da praia, dois pedacinhos de madeira que boiam sob a água no fundo do barco, árvores flagradas em solidão tristíssima. Também o enquadramento do corpo humano poucas vezes havia sido feito de maneira tão original no cinema : detalhes de pés, pernas, mãos, olhos, cabelos, sempre estilizados.

Se no Expressionismo Alemão o recurso visual que transcreve o estado psicológico das personagens é o uso de cenários com geometrias inusitadas, no Realismo Expressionista de Limite é a manipulação das angulações da câmera que repetem processo semelhante.
Outro ponto : há uma tendência nítida em apresentar sempre o movimento de afastamento das personagens. Em geral elas são vistas entrando no quadro vindas de trás da câmera e seguindo no sentido de se distanciar.

https://areslibertarios.wordpress.com/2008/01/01/classicos-do-cinema-mudo-limite-de-mario-peixoto-brasil-1931/

Fonte:Blog Clássicos do Cinema Mudo https://areslibertarios.wordpress.com/2008/01/01/classicos-do-cinema-mudo-limite-de-mario-peixoto-brasil-1931/

Sinopse

Em um barco à deriva, três pessoas em estado de absoluta desolação (um homem e duas mulheres, que os caracteres iniciais apresentam como homem 1, mulher 1 e mulher 2). O filme narrará as estórias de desamor e desamparo destes três personagens.
Estória da mulher um : após um rompimento amoroso, ela parte, em um trem, para uma outra cidade onde irá trabalhar como costureira. O desenrolar da narrativa sugere, por meio de um recorte de jornal, que a moça fugira da cadeia com a ajuda de um carcereiro. Por este motivo, tornará a ir embora.
Estória da mulher dois : Ao chegar em casa encontra o marido (um pianista que toca no cinema acompanhando a exibição dos filmes), dormindo alcoolizado no alto da escada. Abandona a cesta de peixes que trouxera da vila de pescadores e sai para a rua, onde encontra um homem (seu amante ?) com o qual troca algumas palavras (não há letreiros nessa parte) e segue para beira-mar onde, do alto de um monte rochoso lhe ocorrerá a ideia de suicídio.
História do homem 1 : Casado, o jovem mantém um caso extraconjugal com uma mulher também casada. Após a morte desta, vem a saber, da boca do marido traído, no cemitério onde ela está enterrada, que a mulher era ‘morphética’, ou seja, leprosa. Temendo a castração, o jovem mergulha num sentimento de culpa, medo e desespero.


Ficha técnica
Direção, roteiro e montagem: Mario Peixoto.
Fotografia: Edgar Brasil.
Música: Erik Satie, Claude Debussy,
Alexander Borodin, Maurice Ravel, Igor Stravinsky, César
Frank, Sergei Prokofiev.
Elenco: Olga Breno, Taciana Rei, Raul
Schnoor, D.G. Pedrera, Carmem Santos, Mário Peixoto, Iolanda
Bernardes.
Duração: 120 minutos.

Nenhum comentário: