quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Dimensão Experimental "Música, Cinema e Memória" - Man Ray

Dando continuidade as biografias dos cineastas avant-garde que serão musicados no projeto "Música, Cinema e Memória" de autoria do grupo Dimensão Experimental (dia 25/09/2010 na sala de cinema Paulo Amorim na CCMQ ás 18 horas com entrada franca), hoje vamos falar um pouco de Man Ray um dos mais importantes artistas da vanguarda dos anos 20 do século XX. Seu filme "Le Retour à La Raison” de 1923 foi com certeza aquele que provocou maior reação negativa diante de um público que não estava preparado para a proposta revolucionária e artística de seu autor. Posteriormente, Man Ray faz outro filme "Emak-Bakia" (que em lingua basca significa deixe-me em paz) utilizando-se de algumas imagens de "Le Retour à la Raison".









“Le Retour à La Raison” (1923) 2 min. – Man Ray

O pintor e fotógrafo, Man Ray fez seu primeiro filme “Le Retour à La Raison” (1923) em um só dia. O título se refere a um retorno à razão, mas, paradoxalmente, o filme revela-se inteiramente sem razão. Utilizando-se de radiogramas, quadros feitos por objetos colocados diretamente sobre a película, como alfinetes e botões, o filme projetava efeitos metálicos na tela.
O corpo nu de uma mulher foi um dos únicos elementos concretos do filme, que continha cenas comuns em um contexto incomum.
Esta foi uma obra dadaísta, tanto pelos elementos utilizados quanto pelos seus resultados, uma vez que causou uma reação violenta na platéia sendo interrompida a projeção após um minuto.


Man Ray (Emanuel Rabinovitch, Filadélfia, 27 de Agosto de 1890 - Paris, 18 de Novembro de 1976) foi um fotógrafo e pintor norte-americano.
Foi um dos nomes mais importantes do movimento vanguardista da década de 1920, responsável por inovações artísticas na fotografia. Muda-se na infância para Nova Iorque. Estudante de arquitectura, engenharia e artes plásticas, inicia-se na pintura ainda jovem.
Em 1915 conhece o pintor francês Marcel Duchamp, com quem funda o grupo dadá nova-iorquino. Em 1921 contacta com o movimento surrealista na pintura. Trabalha como fotógrafo para financiar a pintura e, com a nova actividade, desenvolve a sua arte, a raiografia, ou fotograma, criando imagens abstratas (obtidas sem o auxílio da câmara) mas com a exposição à luz de objetos previamente dispersos sobre o papel fotográfico.
Como cineasta, produz filmes surrealistas, como L'Étoile de Mer (1928), com o auxílio de uma técnica chamada solarização, pela qual inverte parcialmente os tons da fotografia. Muda-se para a Califórnia em 1940, para explorar as possibilidades expressivas da fotografia. Aí dá aulas sobre o tema. Seis anos depois, retorna a França. Em biografia Auto-Retrato.
Em 1915 fez o primeiro one-man-show, com o que se fez famoso seu nome por toda América, como um dos primeiros pintores abstratos.
Adquire sua primeira câmera para fazer reproduções de seus quadros.
Com Duchamp participa em experimentos fotográficos e cinematográficos e na publicação do único número do New York Dadá. Impulsionado por Duchamp, Man Ray se mudou para Paris em 1921, com a única exceção de 10 anos (entre 1940 e 1951) que viveu em Hollywood durante a Segunda Guerra Mundial, passou o resto de sua vida ali.
Captou o atendimento com suas primeiras fotos abstratas, às que batizou como rayogramas. Errôneamente se considerou inventor da técnica aplicada para isso, que já a tinham experimentado outros artistas anteriormente, entre outros Talbot (para 1840) e - Schad (1918). Publicou 12 de seus rayogramas sob o título "Champs delicieux".
Possuidor de uma grande imaginação, e sempre à frente das vanguardas, trabalhou com todos os meios possíveis: pintura, escultura, fotografia e filmes.
Man Ray falece na França em 1976 e é enterrado no cemitério de Montparnasse.
Em entrevista a Paul Hill e Thomas Cooper em abril de 1974, o pintor e fotógrafo norte-americano Man Ray, nos conta porque se dedicou à fotografia:

" Fui pintor durante muitos anos antes de me tornar fotógrafo. Um dia comprei uma câmera só porque não gostava das reproduções que os fotógrafos profissionais faziam de minhas obras.
Nessa época apareceram as primeiras placas pancromáticas e possibilitaram se fotografar em branco e preto, conservando os valores das cores. Estudei com muita aplicação e depois de alguns meses, me tornei um expert.
Meu interesse maior era com as pessoas, especialmente com os rostos. Em lugar de pintar pessoas, comecei a fotografa-las, e desisti de pintar retratos, ou melhor, se pintava um retrato, não me interessava em ficar parecido. Finalmente conclui que não havia comparação entre as duas coisas, fotografia e pintura.
Pinto o que não pode ser fotografado, algo surgido da imaginação, ou um sonho, ou um impulso do subconciente. Fotografo as coisas que não quero pintar, coisas que já existem".

Recorremos mais uma vez a um texto de Luiz Santiago historiador, critico de cinema e coordenador do blog cinebulição intitulado "A razão segundo Man Ray".

Man Ray foi um artista plural, e o principal artista americano do surrealismo. Além de dirigir filmes, também pintava e fotografava. Em 1924, atuou para René Clair em Entreatos. Também foi assistente de Marcel Duchamp durante o período em que passou na França – no qual também integrou a chamada “Geração Perdida”.

Sua obra O retorno à razão (1923), é um curta-metragem enigma, assim como todo o trabalho surrealista. Os significados e as conclusões para o que nos é apresentado pela câmera podem ser diversos, mesmo para um único indivíduo.
Não há créditos de abertura, no filme. A cena inicial é uma sequência de imagens granuladas, multi-caleidoscópios em preto e branco. Pregos soltos na tela e algumas imagens surrealistas se seguem. A primeira quebra narrativa (talvez uma tentativa de alusão muda ao título) é a imagem de um carrossel funcionando em um parque de diversões, à noite. Vários ângulos são mostrados. A câmera nunca está parada, e se torna subjetiva às vezes. É o primeiro momento em que vemos algo que faça sentido real: closes de um carrossel. Na sequência seguinte, uma outra mudança estrutural-narrativa: uma engrenagem de uma máquina em tamanho gigante (como as de Tempos Modernos, 1936, de Chaplin) é mostrada. No fundo da imagem das máquinas parece haver um palco. Uma luz diagonal reflete o que parece ser a roupa de uma pessoa. No canto superior esquerdo podemos ler a palavra DANCER. Seria o trabalhador que usa essas máquinas, apontado aqui como “dançarino”?

Outras imagens surrealistas se seguem, em alta velocidade. Um “cone” de papel desce em frente à câmera. Uma pequena armação de madeira roda, presa a um barbante, em frente a uma janela iluminada pela luz do sol.
O fechamento do curta, é, novamente, uma “volta à razão”: uma mulher, com os seios à mostra, está em frente à uma janela. O reflexo da cortina sobre seus seios e sua barriga fazem-na parecer um jarro desenhado e alto-relevo. A mesma imagem é mostrada em negativo. E o curta termina com a mulher tomada em um ângulo diagonal.

O que poderia ser o “retorno à razão”, proposto por Man Ray? A tirar pelo término do curta, esse “retorno” a tal razão é falso, porque a razão não existe, segundo as suas experiências fotográficas que alteram a imagem-realidade: ou, o que seriam aquelas imagens reproduzidas pela câmera? Que efeito de “real” produziram no espectador? Seria o ininteligível a “verdadeira razão” do homem, e a sua convencional realidade uma falsidade produzida por ele? Um retorno a qual razão, o cineasta propõe?

Questões filosóficas e surrealistas...

Por Luiz Santiago

Filmografia:

Le Retour à la Raison - 1923
Emak-Bakia - 1926
L Ètoile de Mer - 1928
Les Mystères du Châteu de Dé - 1929

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