terça-feira, 14 de setembro de 2010

Dimensão Experimental "Música, Cinema e Memória" - Marcel Duchamp







O grupo Dimensão Expérimental tem trabalhado com uma proposta que visa resgatar um pouco da magia do cinema mudo através da associação da música como o cinema. Esta associação, unindo-se ao conceito de memória como uma forma de resgate do passado contrastado com o presente, deu origem ao projeto "Música, Cinema e Memória" que não se restringe apenas a uma performance musical dos filmes escolhidos, mas propõe também uma discussão sobre o tema das vanguardas na atualidade. Será que ainda podemos nos referir a esse termo da maneira como habitualmemte era tratado, sendo neste caso algo superado? Ou será possivel que uma uma nova forma de vanguarada ainda que não plenamente identificada pode estar surgindo não só cinema mas nas artes em geral. Se assim for, devemos nos perguntar como poderia ser esta nova vanguarda e que tipo de paradiga ela poderá propor. Este entre outros temas serão abordados pelo palestrante Yury Hendrik (cineasta) no projeto "Música, Cinema e Memória" que no próximo dia 25/09/2010 (sábado) acontecerá na Sala de Cinema Paulo Amorim na Casa de Cultura Mário Quintana ás 18 horas com entrada franca. A apresentação dos filmes, performance musical e palestra promovida pelo grupo Dimensão Experimental faz parte da festa de aniversário de 20 anos da CCMQ.
Na série de filmes e diretores que temos apresentado nas matérias, hoje vamos falar um pouco sobre a obra de Marcel Duchamp e de seu filme "Anemic Cinema".

“Anemic Cinema” (1926) 6 min. – Marcel Duchamp

O primeiro filme de Marcel Duchamp “Anemic Cinema” (1926), cujo título brinca com as letras da palavra cinema, põe em movimento esferas rotatórias ou rotoreliefs (discos em que Duchamp desenhou linhas e círculos concêntricos e excêntricos) que, ao girarem, provocam no espectador uma sensação estranha, como uma nova dimensão. Inscritas nos espirais, as letras vão formando frases indecifráveis, compondo um dos fenômenos visuais mais puros, sensíveis e fascinantes, em uma tentativa de se produzir filmes estereoscópicos. Por Klaus Farina - Músico, Historiador e Produtor Cultural.

O historiador, crítico de cinema e coordenador do blog "Cinebulição" Luiz Santiago tem uma análise interessnte sobre este filme.

"O multiartista Marcel Duchamp procurou usar suas concepções dadaístas para criar realidades de dimensões no cinema. Em seu curta-metragem Anémic Cinéma (1926?), o artista criou diferentes mundos a cada pequena sequência.
Embora a única coisa real do curta sejam os discos com frases dadaístas, como por exemplo, “Entre nossos artigos de quinquilharia preguiçosa, recomendamos a torneira que deixa de escoar quando não escutamos mais”, o espectador é hipnotizado pelos círculos desenhados em discos, que giram, dando uma estranha sensação de outra dimensão.
A cada “disco-figura”, Duchamp inseriu um fotograma com um “disco-palavra”, e na alternância de uma para outro, aumentam a velocidade do giro, o tamanho das palavras e dos discos.
Na dimensão da linguagem, ficamos intrigados ou encantados com o que (não) significam as frases que aparecem. Na dimensão das imagens, observamos que a capacidade de observação de Duchamp era incrível, para criar, em 1929?, uma sensação que viraria formato de cinema no século vinte e um. Anémic Cinéma é uma sessão de hipnose que dura seis minutos, e pela qual todo cinéfilo deve passar".
Por Luiz Santiago

CINEMA ANÊMICO (Anémic cinéma, França, 1926)

Direção: Marcel Duchamp.
Marcel Duchamp
28 de julho de 1887, Blainville (França)
2 de outubro de 1968, Nova York (EUA)

Biografia:

Artista francês, Marcel Duchamp nasceu em Blainville, França, a 28 de julho de 1887, e morreu em Nova York, EUA, em 2 de outubro de 1968. Irmão do pintor Jacques Villon (Gastón Duchamp) e do escultor Raymond Duchamp-Villon. Freqüentou em Paris a Academie Julian, onde pinta quadros impressionistas, segundo ele, "só para ver como eles faziam isso".
Em 1911-1912 suas obras "O rei e a rainha cercados de nus" e "Nu descendo uma escada" estão na confluência entre o Cubismo e o Futurismo. São quadros simultaneistas, análises do espaço e do movimento. Mas já se destacam pelos títulos, que Duchamp pretende incorporar ao espaço mental da obra.
Entre 1913-1915 elabora os "ready-made", isto é, objetos encontrados já prontos, às vezes acrescentando detalhes, outras vezes atribuindo-lhes títulos arbitrários. O caso mais célebre é o de "Fonte", urinol de louça enviado a uma exposição em Nova York e recusado pelo comitê de seleção. Os títulos são sugestivos ou irônicos, como "Um ruído secreto" ou "Farmácia". Detalhe acrescentado em um "ready-made" célebre: uma reprodução da Gioconda, de Leonardo da Vinci, com barbicha e bigodes.
Segndo o crítico e historiador de arte Giulio Carlo Argan, os "'ready-mades' podem ser lidos como gesto gratuito, como ato de protesto dessacralizante contra o conceito 'sacro' da 'obra de arte', mas também como vontade de aceitar na esfera da arte qualquer objeto 'finito', desde que seja designado como 'arte' pelo artista".
Esses "ready-mades" escondem, na verdade, uma crítica agressiva contra a noção comum de obra de arte. Com os títulos literários, Duchamp rebelou-se contra a "arte da retina", cujos significados eram só, segundo ele, impressões visuais. Duchamp declarou preferir ser influenciado pelos escritores (Mallarmé, Laforgue, Raymond Roussel) - e não pretendia criar objetos belos ou interessantes. A crítica da obra de arte se estendia à antítese bom gosto-mau gosto.
Entre 1915 e 1923 o artista dedicou-se à sua obra principal, "O grande vidro", pintura a óleo sobre uma placa de vidro duplo dividido em duas seções. A parte superior chamou de "A noiva desnudada pelos seus celibatários, mesmo"; e a inferior, "Moinho de chocolate". Toda a obra é um pseudomaquinismo: a "noiva" é um aparato mecânico, assim como os "celibatários". Contendo vários níveis de significação, várias hipóteses foram formuladas pela crítica para descobrir o sentido de sua complicada mitologia.
Para Giulio Carlo Argan, "O grande vidro" foi desenvolvido "em torno de significados erótico-místicos, joga com a transparência do espaço, com o significado alquímico e simbólico, com o conceito de 'andrógino', inato em todos os indivíduos".
Coincidir arte e vida
Após "O grande vidro", Duchamp dedicou-se aos mecanismos ópticos - que chamou de "rotorrelevos". Em 1941 executa uma "caixa-maleta", contendo modelos reduzidos de suas obras, e, em 1943, a "Caixa verde", contendo fotos, desenhos, cálculos e notas.
A partir de 1957 vive em Nova York, dedicando-se à sua paixão pelo jogo de xadrez. Seu silêncio parece uma redução da capacidade inventiva, mas após sua morte descobre-se que o artista estivera trabalhando secretamente na construção de um "ambiente": um quarto fechado onde repousa uma figura em cera, cercada de vegetações. O ambiente só pode ser visto, por determinação do artista, por um orifício da porta.
A obra de Duchamp, reduzidíssima, foi menos obra do que uma atitude, um gesto crítico radical, mas em muitas declarações o artista recusou-se a ser visto como um destruidor. A atitude crítica de Duchamp ainda repercute, tantos anos depois de suas criações radicais.
Na opinião de Giulio Carlo Argan, "talvez a obra de Duchamp alquímica por excelência seja toda a sua vida, que serve de modelo para todas as novas vanguardas do segundo pós-guerra, do 'New Dada' às experiências de recuperação do corpo como expressão artística, na intenção de fazer coincidir arte e vida".

Fontes:

- Enciclopédia Mirador Internacional
- "Arte moderna", Giulio Carlo Argan, Editora Cia. das Letras.
- site uol - Educação

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